Mostra tudo!
Quando a festa começa, quem não corre fica pra trás
Flexibilidade e resistência são importantes pra sair inteiro no final.
Quando os camisas-vermelhas começaram a andar por aí todo mundo já sabia: a espera tinha terminado e o show estava pra começar. Como acontece todos os anos, seguiram-se filas quilométricas, esperas intermináveis e um pouco de bagunça, porque ninguém é de ferro. Mas com o amanhecer do dia 19 de outubro era oficial: estava aberta ao público a 31ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
A edição de 2007 da mostra traz mais de 400 filmes de 77 países, sendo 49 autênticas produções tupiniquins, entre curtas, médias e longas. O problema, como em todas as edições, é conseguir ingressos para os filmes mais concorridos, como o vencedor da Palma de Ouro em Cannes 4 meses, 3 semanas e 2 dias e os filmes dos queridinhos dos cinéfilos paulistanos, como Gus Van Sant, Lars Von Trier e o israelense Amos Gitai. A alternativa, para quem não quis – ou não conseguiu – comprar os pacotes para assistir a 20 ou 40 filmes, é chegar à bilheteria do cinema uma hora antes da primeira sessão. Numa dessas é possível sair com o ingresso para o filme escolhido e, não raras vezes, com alguns novos conhecidos, seja porque a sessão vai atrasar, porque o sistema está com problema ou porque vocês não deixaram o espertinho que fingia digitar no celular furar a fila.
Os cinéfilos afeitos a história vão gostar de saber que tudo começou em 1977, quando foi realizada por Leon Cakoff a primeira edição da mostra, como celebração dos trinta anos do MASP, o nosso Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. A mostra de ’77 inaugurou o ritual de o melhor filme ser escolhido pelo voto do público e teve como vencedor Lúcio Flávio, o passageiro da agonia, de Hector Babenco, o garoto propaganda da 31ª mostra (e diretor de um dos filmes mais aguardados, O Passado, com Gael García Bernal).
Nascido na Síria, em 1948, Leon Chadaverian veio para o Brasil com a família aos oito anos de idade. Formou-se pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, dedicou-se ao cinema - inicialmente como crítico – e adotou o pseudônimo Cakoff.
Enfrentando dificuldades impostas pela censura do regime militar (algo que só cessaria em 1985, graças à portaria assinada pelo Ministro da Justiça Fernando Lyra), Cakoff reuniu para a primeira mostra 16 longa-metragens e sete curtas, apresentados em quarenta sessões no Grande Auditório do MASP.
Foi em 1984, no entanto, que a mostra emancipou-se. Abandonou o MASP e passou a ocupar, provisoriamente, um escritório emprestado pela Secretaria Municipal da Cultura, na cobertura do Edifício Martinelli. Data deste ano também o maior embate com o regime militar. Depois de, em 1978, ter invocado a Convenção de Genebra para se comunicar com Cuba e trazer para a sua segunda edição filmes produzidos na ilha (tendo um dos quais, A Última Ceia, de Tomás Gutierrez Alea, vencido o Prêmio de Público) a equipe da mostra foi golpeada com a cassação da liminar que concedia o direito de exibição dos filmes sem censura prévia. O público que assistia ao O Estado das Coisas, de Wim Wenders, no Cine Metrópole, foi surpreendido com a invasão da Polícia Federal e a leitura, ao final da sessão, da carta que interrompeu a mostra por quatro dias. Nesse período os censores do Ministério da Justiça, chefiado por Ibrahim Abi-Ackel, viveram o sonho de qualquer cinéfilo e assistiram a todos os filmes da programação. Felizmente, ao contrário do que se passou em 1980, quando um curta-metragem que mostrava a doutrinação socialista de crianças chinesas foi vetado, em 1984 nada foi censurado.
Daí para a frente nada mais seguraria a Mostra que, apesar de passar por momentos difíceis, como a falta de patrocínios em 1990 (quando foi socorrida pela produtora francesa Argos Films), também colheu grandes vitórias, como a obtenção de uma instrução normativa junto à alfândega, em 1996, que eliminava as dificuldades burocráticas, facilitando o trânsito dos filmes no país. E mesmo sofrendo com as filas intermináveis, as esperas quilométricas e a bagunça de ferro, todos os cinéfilos aguardam ansiosamente o mês de outubro, para viver o furor que toma de assalto a cidade e sentir essa paixão borbulhante, que é a nossa pelo cinema. Mas corra, porque chegando novembro, só no ano que vem.
Quando a festa começa, quem não corre fica pra trás
Flexibilidade e resistência são importantes pra sair inteiro no final.
Quando os camisas-vermelhas começaram a andar por aí todo mundo já sabia: a espera tinha terminado e o show estava pra começar. Como acontece todos os anos, seguiram-se filas quilométricas, esperas intermináveis e um pouco de bagunça, porque ninguém é de ferro. Mas com o amanhecer do dia 19 de outubro era oficial: estava aberta ao público a 31ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
A edição de 2007 da mostra traz mais de 400 filmes de 77 países, sendo 49 autênticas produções tupiniquins, entre curtas, médias e longas. O problema, como em todas as edições, é conseguir ingressos para os filmes mais concorridos, como o vencedor da Palma de Ouro em Cannes 4 meses, 3 semanas e 2 dias e os filmes dos queridinhos dos cinéfilos paulistanos, como Gus Van Sant, Lars Von Trier e o israelense Amos Gitai. A alternativa, para quem não quis – ou não conseguiu – comprar os pacotes para assistir a 20 ou 40 filmes, é chegar à bilheteria do cinema uma hora antes da primeira sessão. Numa dessas é possível sair com o ingresso para o filme escolhido e, não raras vezes, com alguns novos conhecidos, seja porque a sessão vai atrasar, porque o sistema está com problema ou porque vocês não deixaram o espertinho que fingia digitar no celular furar a fila.
Os cinéfilos afeitos a história vão gostar de saber que tudo começou em 1977, quando foi realizada por Leon Cakoff a primeira edição da mostra, como celebração dos trinta anos do MASP, o nosso Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. A mostra de ’77 inaugurou o ritual de o melhor filme ser escolhido pelo voto do público e teve como vencedor Lúcio Flávio, o passageiro da agonia, de Hector Babenco, o garoto propaganda da 31ª mostra (e diretor de um dos filmes mais aguardados, O Passado, com Gael García Bernal).
Nascido na Síria, em 1948, Leon Chadaverian veio para o Brasil com a família aos oito anos de idade. Formou-se pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, dedicou-se ao cinema - inicialmente como crítico – e adotou o pseudônimo Cakoff.
Enfrentando dificuldades impostas pela censura do regime militar (algo que só cessaria em 1985, graças à portaria assinada pelo Ministro da Justiça Fernando Lyra), Cakoff reuniu para a primeira mostra 16 longa-metragens e sete curtas, apresentados em quarenta sessões no Grande Auditório do MASP.
Foi em 1984, no entanto, que a mostra emancipou-se. Abandonou o MASP e passou a ocupar, provisoriamente, um escritório emprestado pela Secretaria Municipal da Cultura, na cobertura do Edifício Martinelli. Data deste ano também o maior embate com o regime militar. Depois de, em 1978, ter invocado a Convenção de Genebra para se comunicar com Cuba e trazer para a sua segunda edição filmes produzidos na ilha (tendo um dos quais, A Última Ceia, de Tomás Gutierrez Alea, vencido o Prêmio de Público) a equipe da mostra foi golpeada com a cassação da liminar que concedia o direito de exibição dos filmes sem censura prévia. O público que assistia ao O Estado das Coisas, de Wim Wenders, no Cine Metrópole, foi surpreendido com a invasão da Polícia Federal e a leitura, ao final da sessão, da carta que interrompeu a mostra por quatro dias. Nesse período os censores do Ministério da Justiça, chefiado por Ibrahim Abi-Ackel, viveram o sonho de qualquer cinéfilo e assistiram a todos os filmes da programação. Felizmente, ao contrário do que se passou em 1980, quando um curta-metragem que mostrava a doutrinação socialista de crianças chinesas foi vetado, em 1984 nada foi censurado.
Daí para a frente nada mais seguraria a Mostra que, apesar de passar por momentos difíceis, como a falta de patrocínios em 1990 (quando foi socorrida pela produtora francesa Argos Films), também colheu grandes vitórias, como a obtenção de uma instrução normativa junto à alfândega, em 1996, que eliminava as dificuldades burocráticas, facilitando o trânsito dos filmes no país. E mesmo sofrendo com as filas intermináveis, as esperas quilométricas e a bagunça de ferro, todos os cinéfilos aguardam ansiosamente o mês de outubro, para viver o furor que toma de assalto a cidade e sentir essa paixão borbulhante, que é a nossa pelo cinema. Mas corra, porque chegando novembro, só no ano que vem.